quarta-feira, setembro 20, 2006

A cegonha aponta no horizonte

Tomei um susto.

Já havia tomado um outro, nem faz tanto tempo assim, quando minha amiga de infância, Kelly, resolveu ser a primeira de nós a dar à luz um rebento. Bem, na verdade, foi o rebento quem resolveu se dar à luz. Mas isso não tira de sua mãe o posto de pioneira.

Ela disse que queria falar comigo e, como há muito tempo não conversávamos, logo desconfiei do tópico. Foi só esperar a confirmação.

Assim, naquela manhã ensolarada de domingo, ela entrou na minha sala, sentou no sofá sem dizer uma palavra, cruzou as pernas e, como se só estivesse ali para fazer aquilo, abriu o Extra e começou a ler as machetes com o ar mais casual que podia forjar.

Olhei para a Sil, nossa outra amiga de infância que também estava em cena, com uma cara de "O que ela está fazendo?". Ela me devolveu uma cara de "Ela sempre foi estranha assim". Aí, como se não tivesse percebido a curiosidade que pairava, ela interrompeu o curto silêncio cheio de caretas que havia se instalado. Com um golpe típico de sua delicadeza, abaixou o jornal e anunciou:

- Tô gravida.

Silêncio de novo. Sil obeserva o quadro com cara de "Já sabia". E eu:

- É ruim, hein!

Eu também achava que já sabia. Já estava preparada e até esperando pelo que ouvi. Mas ouvir foi chocante. Ouvir tornou a desconfiança uma verdade. Meu Deus, como pode? Não faz dez anos que estávamos jogando taco na rua!

"Caraca" e "Nada a ver essa blusa" foram as duas coias que pensei. "Caraca" porque é de praxe. Sempre ajo como de praxe quando tomo sustos. E "Nada a ver essa blusa" porque ela estava com uma blusa rosa que não tem nada a ver mesmo. Não consigo evitar constatações.

O bebê anunciado na ocasião tem, hoje, 1 ano e dois meses. Chama-se, depois de muita dúvida acerca do nome, José Mauro Neto e tem a madrinha mais desiquilibrada e neurótica de que se tem notícia: eu.

Ainda não consegui me recuperar do susto. E ainda, às vezes, me parece surreal que vá até a casa da Kelly para insistir que meu pobre afilhado repita para mim suas gracinhas e - pelo amor do senhor, só dessa vez - permaneça olhando para a câmera enquanto eu o fotografo. Eu deveria estar indo até lá para convocá-la a completar o timinho, não?

Não. Faz muito tempo - e só agora me dei conta! - que não jogamos nada. Ela virou mãe e eu, dinda. É estranho e a criança vai crescendo dia-a-dia, fazendo as vezes de cronômetro para mim. De vez em quando, olho para a Kelly e não consigo conceber que, de fato, aquilo tudo é de verdade e não mais uma de nossas brincadeiras.

Ter uma criança por perto é alegre e assutador. Torna o futuro muito palpável, muito presente, provando que o tempo é como diziam. Passa mesmo. Achava ainda que teria um bom espaço dele para me acostumar a tudo isso. Mas, ontem, meu telefone tocou. Mal ouviu minha voz, minha mãe foi direta:

- Ó, não conta pra ninguém que é pra ser surpresa: você vai ser tia.

Assim mesmo, tudo de uma vez. Dei uma parada. "Caraca" e "Putz, vai comprometer o caimento do vestido" foram as duas coisas que pensei. "Caraca", dessa vez, foi ao quadrado. Afinal, eu sequer desconfiava. E "Putz, vai comprometer o caimento do vestido" porque minha irmã vai ser madrinha de casamento de uma amiga em novembro. (Acho que bebês, de alguma forma, despertam meu lado Glorinha Kalil.)

Vou ser tia. Fui tomar banho pensando se meu sobrinho vai ficar parado enquanto eu faço fotos.

sábado, setembro 16, 2006

Na onda das eleições

Duas semanas para as eleições. Em tempo:

"
- Momento cultura inútil: sabe de onde veio o termo "candidato"?
- De cândido?
- Mais ou menos. Do latim "candidati", que quer dizer "os muito brancos", ou coisa que o valha.

Silêncio.

- É que, na Roma antiga, quem se candidatava a qualquer cargo costumava clarear bastante suas togas, pra que ficassem muito brancas. Deve ser por isso que há tantos médicos na política hoje.
- Se isso fosse verdade, cabeleireiros e açougueiros também se candidatariam muito. Aliás, cabeleireiros não. Isso não existe mais. Agora é hair stylist, que é muito mais fácil de escrever.
- Ou barbeiro...
- Barbeiro??? Ninguém mais fala barbeiro. Agora é hair stylist, juro! Outro dia fui cortar o cabelo e pedi o cartãozinho do cabeleireiro. Tinha escrito lá apenas assim, em letras centralizadas: "Fulano de Tal - Hair". Mais gay impossível.
"

Vote consciente! Ou não.

sexta-feira, setembro 15, 2006

E não é que o blog tá andando?

"Em casa de subúrbio, televisão é relógio". Gosto da simplicidade categórica desse tipo de frase. São as únicas que nos abrem sorrisos contidos demais para não mostrarmos os dentes, mas largos o suficiente para que os notemos. E isso que é sorriso bom!

Pela tangente

Quanto ao desafio do Crassus, meto meu rabo entre as pernas e digo: "foi mal aê...". Já disse em um outro país dessa internet que raramente memorizo o que leio, não sei citar, não sei nem parafrasear. A coisa adentra o sistema, mas se mistura na zona-de-quarto-de-moleque-de-dezesseis-anos-chato-e-remelento de lá de dentro. Dissolve-se. Vira o quê? Vai saber. Mas se perder não se perde não.

Repito-me: eu não leio; faço digestão.

Filhos, os bichos de estimação

Por favor, por favor! Ei, eu estou com o braço levantado! Espera a sua vez, Wellington! É que eu queria também fazer um comentário sobre essa história do acidente na Lagoa.

Quer dizer, acidente uma ova. Quem dirige bêbado e em alta velocidade do jeito que eles estavam não sofre acidente. Comete homicídio e - efeito colateral irritante - suicídio também. Por mais que tenham matado aula pra vagabundear no Rio Sul, todos os cinco mortos deviam ter conhecimento, ainda que superficial, das leis da física. Sabiam sim o que estavam fazendo; só eram idiotas demais para fazê-lo ainda assim.

Idiotas sim; coitados não. Cala a boca, Wellington! Depois você dá a sua opinião, e diz por quantas linhas você quiser o quanto o Estado e os pais são culpados dessa tragédia. É que você e muitas pessoas têm a mania de achar que jovem é uma mistura de bicho de pelúcia e portão recém-pintado. Não tente entender a metáfora, só preste atenção no fato de nenhum dos dois é dotado de razão. Trata-se o jovem como se fosse um ser inanimado, sem a menor capacidade de discernimento ou noção de perigo. Culpa-se as autoridades e os pais como se, enfim, eles devessem ser os protetores eternos dos cinco adolescentes, incapazes de saber que brincar com fogo dá queimadura. Vai catar coquinho, Wellington! A polícia tem mais o que fazer do que ser babá de criança retardada, e os pais estão ocupados demais pra ficar lambendo crias de quase 20 anos.

Morreram. Triste? É claro que é. Mas que assumam a responsabilidade ao menos na morte; já basta se esquivarem dela em vida.

Agora fala, Wellington!

quinta-feira, setembro 14, 2006

Insônia

Já passou da meia-noite. Eu trabalho amanhã. Deveria estar na cama. Numa noite normal, estaria. Até tentei. Fui deitar cedo, antes da novela das 8 acabar. Em casa de subúrbio, televisão é relógio.

Deitei e peguei um livro. Sempre leio na cama, antes de dormir. A História do Cerco de Lisboa está esquentando agora. Não consegui parar de ler. Perdi o sono. E olha que estava cansado. Vim para o computador para ver se tinha alguém online para me ouvir dizer o quanto Saramago é foda. Não tinha.

Amanhã vou passar o dia que nem um zumbi por causa desse velho portuga. E não terei tempo para ler durante o dia. Vou ficar esperando para ler de noite. São raros os autores que me fazem perder o sono. Só Saramago e Garcia Marques, até agora. Subitamente me dei conta de que passo as madrugadas na companhia de dois coroas medonhos e ainda sinto prazer com isso.

Boa noite. Vou voltar para o meu livro.

domingo, setembro 10, 2006

Um comentário desagradável acerca dos jornais da semana

É absolutamente ridícula a forma como a mídia explora o acidente que matou aqueles jovens bêbados, inconsequentes e motorizados na Lagoa, na semana passada. Ué, você não soube? Que honra tê-lo por aqui, caro E.T. Deixe um comentário.

O Globo estampou na capa durante toda a semana algum assunto relacionado ao acidente. Forçando a barra até não poder mais, a batida serviu para abrir os olhos dos brasileiros diante do perigo da fórmula álcool + volante, como se fosse uma grande novidade.

Só faltaram propagandas oportunistas. Deram mole, publicitários. Que lindo seria a Ambev fazendo uma grande campanha de conscientização: se faz de boazinha e, de quebra, fideliza cliente, agrega valor à marca, chama atenção para o produto, melhora sua imagem institucional...

Queria ver se a batida fosse lá em Campo Grande. Um Fiat Uno ano 91 cheio de adolescentes que tomaram todas na barraquinha de podrão perto do West Shopping capotando 5 vezes no caminho para Santa Cruz é apenas um grupo de pobres coitados pagando um preço alto pelo mínimo de diversão que se dão o direito de ter. Não é pauta, a não ser para O Povo.

Por mais AB que seja o público-alvo, nada vende mais jornal do que uma tragédia bem escabrosa. Nisso tanto o Povo quanto o Globo concordam. E aproveitam esse nosso estranho fetiche. Duvido que o número de jovens recém-conscientizados seja proporcional ao lucro, aos comentários, à repercussão. Alguém que paga 80 reais de consumação numa boate não vai jogá-los fora nem depois de uma semana de intensa lavagem cerebral. Até porque a boate não vai reduzir o preço. Minha sugestão? Encareçam a cerveja.